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- Um dos escravos de certo
ex-cônsul da África do Norte, não suportando a crueldade do seu
senhor, fugiu numa noite, embrenhando-se numa imensa floresta, onde
permaneceu por algum tempo até que, recapturado, foi parar em Roma.
Ali, alguns anos mais tarde Caio César, realizava um terrível
combate com as feras. No decorrer dessa nefasta programação, foi
colocado dentro da arena o escravo foragido, cujo nome era Androcles.
Ao vê-lo a distância, o leão estacou como que surpreendido,
depois aproximou-se vagarosamente e com total tranqüilidade pôs-se
a lamber-lhe os pés, as amos e os braços.
O infeliz escravo, apavorado pela idéia de morrer devorado por uma
fera faminta, sentiu as pernas tremerem e o coração a bater
descompassadamente, enquanto recebia as carícias de um tão temível
animal.
Finalmente, pouco a pouco, tentando controlar essa situação de
medo, ele foi readquirindo as forças e a coragem perdida. Voltou
então os olhos para o leão e ambos, naquele momento, pareciam
trocar efusivos
cumprimentos, assim como quem estava se reconhecendo mutuamente.
O povo, estarrecido com a cena estranha, rompeu em voz alta,
aclamando o escravo. O imperador o chamou e indagou a respeito do
acontecimento que o emocionou.
Então o escravo relatou uma surpreendente história. Contou que
naquela noite que fugira do seu cruel senhor, embrenhando-se na
floresta, escondeu-se numa solitária caverna. Alta madrugada,
entrava também ali um leão que manquejava, em virtude de um grave
ferimento em sua pata.
Deitou-se a um canto, distante da pequena tocha acesa pelo escravo
e, por seus gemidos, deu a entender a torturante dor que sofria.
De início, Androcles teve medo de socorrer a fera, mas depois,
vendo-a
erguer a pata, descobriu uma enorme lasca de lenha ali cravada. O
escravo, servindo-se de uma pequena faca que levava consigo, com
grande paciência e cuidado para não causar ainda maiores
sofrimentos ao animal, conseguiu arrancar a estaca. Lavou o
ferimento, retirando toda a terra ali acumulada, e o pobre leão
pode repousar um pouco.
Agora, tanto tempo depois, os dois se encontraram novamente e desta
feita naquela arena. Assim como o escravo soube ser misericordioso
para com a fera necessitada, agora esta lhe recompensou poupando-lhe
a vida, num grande gesto de misericórdia.
Misericórdia e piedade é uma nobre filha da fé, que une em si
todas as
obras do mais forte e também mais privilegiado em relação ao próximo
necessitado. Saibamos, portanto, praticá-la na certeza de um dia
recolhermos os frutos dessa benfazeja semeadura.
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